quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Devaneios teatrais sobre os tempos e espaços escolares...

Acho que a idéia de tempos e espaços escolares não está muito clara para mim. Durante os últimos dias pensei muito no assunto, mas não sei se cheguei às conclusões que pretendia.
Sinto que tenho muitas perguntas sem resposta e talvez algumas respostas sem concretas perguntas.

Vivemos em uma era onde tudo é informação. A cada minuto uma infinidade de novidades chegam até nós. A internet torna-se a mediadora entre você e o mundo. Tudo está ao nosso alcance, a cada dia “mais coisas nos passam e menos coisas nos ficam”. Pouco se absorve das centenas ou milhares de informações, imagens, conteúdos... Que nos passam diariamente, nossa memória abre mão de algumas informações para dar lugar a outras novas.
Cada vez mais temos menos tempo para experimentar as coisas, afinal é muita coisa para aprender em pouco tempo.
Corremos contra o tempo. Lembro-me perfeitamente dos meus professores dizendo que tinham de correr atrás do conteúdo, senão não conseguiriam dar toda a matéria em apenas um ano. Ou quando um professor explicava uma matéria e no outro dia realizava uma prova. Ou quando passávamos de ano e um professor tinha de dar alguma matéria atrasada para poder ensinar um próximo conteúdo. Sem falar que em todos os anos precisávamos de uma revisão para recomeçar as aulas, pois já não lembrávamos de absolutamente nada.
O ensino médio era a prova concreta de que o tempo não parava, de que tínhamos muito conteúdo a aprender, sem falar que em breve precisaríamos provar tudo o que sabíamos afinal o vestibular estava chegando. Nesse momento tudo valia: musiquinha, macete, fórmulas, decoreba... Tudo para passar na avaliação.
Sinto que houve uma grande preocupação com a nossa aprovação no concurso, mas pouco se preocuparam em analisar se estávamos realmente aprendendo alguma coisa.


Informação X Tempo

+ Informação - Tempo


Nos meus tempos de escola (o que não faz muito tempo) eu me sentia uma caixinha vazia prestes a receber uma tonelada de informações. O peso era tanto que aos poucos eu as fui deixando pelo caminho. Pouca coisa eu recordo com clareza, muitas faço força para lembrar.
Pergunto-me de que isso adianta? Será que essa é a melhor forma de aprender? E de ensinar? Será que estamos realmente aprendendo? Quais são os nossos objetivos quando entramos em uma sala de aula como alunos e como futuros educadores? Continuaremos reproduzindo o modelo educacional atual? Ou iremos transgredir estes limites para que possamos realmente ensinar fazendo uso de diferentes instrumentos e métodos de ensino?

Questiono o sistema de ensino, afinal o conhecimento, em minha opinião, não se dá (apenas) através de livros, teorias, fórmulas, resenhas... E sim de vivência, de experiência.
Aprendemos com o outro, aprendemos vivendo, descobrindo, procurando, aprendemos com as nossas experiências de vida.
O conhecimento não está fixo no ambiente escolar, ele também se dá em ambientes não escolares, em ambientes formais e não formais.
Aos poucos nosso sistema educacional está se transformando, novas portas estão se abrindo, novas visões estão sendo consideradas e novas teorias estão sendo debatidas.
Pequenas inovações estão modificando nossas formas de aprender. O próprio EAD (educação à distância) está quebrando com as fronteiras que temos culturalmente estabelecidas como instituição de ensino. É uma nova forma de pensar educação, uma forma de quebrar com o nosso modelo educacional tradicional e ultrapassado.
Certa vez em uma plenária no departamento de Arte Dramática uma professora chegou com a proposta de ensinar teatro à distância. Fiquei muito tempo refletindo sobre isso. Se no teatro enfatizamos o coletivo, o aprender com o outro, o ouvir o outro, o representar, o improvisar, o jogar; como isso poderia ser feito à distância.
Lembro-me de algumas sugestões dadas por professores: “Podemos marcar encontros bimestrais.”. “Mas ai não poderemos mais cobrar as faltas dos alunos do departamento, ninguém poderá rodar por FF.”, “O contato é imprescindível no teatro! Não temos como ensinar à distância”. “Então o curso à distância será absolutamente teórico!”. Neste momento todos acataram a idéia. O departamento iria disponibilizar a comunidade o curso teórico de teatro à distância.
Pergunto-me: Qual seria a utilidade deste curso? Ele habilitaria profissionais para lecionarem em escolas? E como ficam os elementos chave do fazer teatral? Haveria outra saída para esta situação? Como ensinar teatro desta forma?
Por tantas dúvidas e dificuldades o projeto, pelo que me parece, não foi aceito.

Acredito que as artes teriam muito a acrescentar e a contribuir para a educação, pena que ela não receba o devido valor.
Segundo o PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) o ensino de arte, o que compreende Artes Visuais, Teatro, Dança e Música é obrigatório o currículo escolar. Porém, na prática isso não ocorre.
Através do ensino de educação artística conquistamos um modesto lugar no ambiente escolar, mas devido à desvalorização da arte diante das demais matérias do currículo escolar não conseguimos transgredir nossas barreiras.

Quanto ao ensino do teatro nosso sistema é absolutamente displicente. Pouquíssimas escolas têm acesso à arte teatral e destas poucas possuem profissionais qualificados para desempenhar esta função.
O que ocorre é uma grande desvalorização do fazer teatral, muitas vezes comparado e confundido com recreação.
Pensam que Teatro é mero divertimento sem aprendizado e reflexão, ou seja, uma disciplina absolutamente dispensável e que é capaz de ser ensinada por qualquer pessoa que tenha experiência com crianças ou adolescentes.
Quando comecei a dar aulas passei por situações bastante complicadas com uma turma de crianças de 08 a 12 anos. Inúmeros jogos e atividades por mim sugeridas no decorrer das aulas eram desrespeitadas e/ou criticadas pelos alunos. Embora eles sentissem vontade de participar, de brincar, de experimentar, não queriam jogar, pois tinham como referência que brincadeira era coisa de criança e que eles já estavam ficando grandes e tinham que estudar. Uma vez me perguntaram quando é que iríamos aprender sobre teatro, pois no seu raciocínio brincar, jogar, observar, coletivo, espontaneidade, criatividade... Não é aprender, e sim pura diversão, e isso não é algo que se deva fazer na escola.
Se temos hora para brincar e hora para estudar, por que estamos brincando e jogando na escola? Algo não fechava na cabecinha deles, e com razão. Cresceram ouvindo isso, a cada vez mais cedo estas cobranças estão sendo feitas.
Estudos, responsabilidade, maturidade para encarar o mercado te trabalho. Nosso ensino é reflexo da nossa sociedade. Não ensinamos para formar cidadãos, pessoas inteligentes, cultas... Ensinamos para formar novos advogados, médicos, dentistas, arquitetos e engenheiros, ensinamos para suprir nossas demandas de profissionais.
Formamos milhares de profissionais incapazes de lidar com pessoas, de trabalhar em grupo. Pessoas cada vez menos criativas e espontâneas. Pessoas cada vez mais alienadas na sua área, neste mundo fragmentado e subdividido refletido também na escola na divisão das matérias e na dificuldade interdisciplinar.

Acredito que as artes possuem a cura para muitos vícios de nossa sociedade, mas para que esta transformação seja possível precisamos conquistar nosso espaço na escola e na sociedade, como artistas e como educadores, pois para que a arte reflita de uma forma geral na educação e a educação na arte.
Enquanto artistas estamos conseguindo atravessar as fronteiras do tempo e do espaço, mas quanto a educação penso que temos um longo caminho pela frente, embora já tenhamos uma sensibilidade e um olhar diferenciado sobre o ensino que talvez falte a outras áreas, ainda temos que nos articular, refletir e principalmente agir para conquistar o nosso espaço no sistema de educação.

“Todos são capazes de atuar, de jogar, de improvisar. Aprendemos através da experiência, e ninguém ensina nada a ninguém.”

Viola Spolin - Improvisação para o teatro.

“Na performance do ser os acontecimentos são mais fortes do que nós porque são se ego e acontecem na relação, no circuito e não no isolamento. Basta pensar que o que de importante acontece conosco não é quando estamos sozinhos. Dividir presença e emoção assim como no teatro é acontecimento de risco e volúpia vivido pela relação do ator com o espectador.”
Jean Gilbert




“A fonte primária de toda atividade educativa está nas atividades instintivas e impulsivas da criança, e não na apresentação e aplicação de material externo, seja através de idéias de outros ou através dos sentidos; e, conseqüentemente, inúmeras atividades espontâneas das crianças, jogos, brincadeiras, mímicas... são passíveis de uso educacional e não apenas isso, são as pedras fundamentais dos métodos educacionais.”

Richard Courtney


“A experiência, a possibilidade de que algo nos passe ou nos aconteça ou nos toque, requer um gesto de interrupção, um gesto que é quase impossível nos tempos que correm: requer parar para pensar, para olhar, parar para pensar, pensar mais devagar, olhar mais devagar e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo, suspender a vontade, suspender o automatismo da ação, cultivar a atenção e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço.”

Jorge Larrosa – Linguagem e educação depois de Babel.



LEI 939496 – 20/12/1996
Led Ed. Nac


Art 26 – Os currículos do Ensino. Fundamental e médio devem ter uma base nacional comum a ser complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura e da economia.

Parágrafo 2 – O ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos.

Camila Galarza

2 comentários:

Betina Sisnande disse...

Não gostei do teu texto Camila, primeiro porque é muito longo e segundo porque tu escreveu metade das coisas que eu ia colocar...rsrsrsrsrs, mas eu te amo mesmo assim...

Claudio Britto disse...

Camila
Parabens pela sua postagem! Muito boa! Vc eh uma pensadora, critica. Isso e muito bom!
Fiquei pensando sobre esse seu trecho:
"Questiono o sistema de ensino, afinal o conhecimento, em minha opinião, não se dá (apenas) através de livros, teorias, fórmulas, resenhas... E sim de vivência, de experiência"
Lembrei me que conheci uma historia de alguem que usou o metodo da experiencia, que vc citou, para se ensinar.
Um certo homem, um professor, tinha algo muito importante a ensinar. Este homem usou o metodo de andar junto, comer junto, viver as experiencias juntos e com elas, ensinar seus alunos. Ele teve um numero reduzido de alunos: doze. Um destes, se perdeu no meio do aprendizado, e nao "concluiu o curso". Mas os outros onze aprenderam, e muito bem, pois com os ensinamentos que receberam, influenciaram 1/3 de toda a humanidade, ou seja, 2 bilhoes de pessoas. 11 pessoas aprenderam e com estes ensinamentos ensinaram da mesma forma e este conhecimento chegou a estas bilhoes de pessoas. Este homem, um judeu eh Jesus de Nazare e esses 11 alunos sao seus discipulos que levaram estes ensinos (o evangelho - que siginifica "Boas Novas" - ) e hoje, 2 bilhoes de pessoas declaram seguir este evangelho.
O assunto em pauta nao eh a religiao, mas a forma de ensino.
Jesus teve tres anos e meio para ensinar aqueles homens. E funcionou. Ele andava junto com eles, no frio e no calor do deserto. Na terra ou no mar eles estavam juntos. (meio poetico nao eh? rsrs)
Mas a questao, penso eu, eh como fazer um ensino desta forma nos dias de hoje? Como "andar" com os alunos e te los perto de si todo o tempo?
Este e um questionamento que nao tenho resposta... Alias, por isso eu postei este comentario... Para que reflitamos neste metodo de ensino, que se mostrou extremamente eficaz, e como poderiamos aproveitar disso algo utilizavel para atravessar os espacos e tempo da educacao pos moderna de hoje?
Um abraco!
Claudio Britto